Aceitando o "não" como a vontade de Deus
Fico admirado que, à luz do
claro registro bíblico, alguém tenha a audácia de sugerir que é errado
para os aflitos de corpo ou alma expressar suas orações por libertação
em termos como “Se for a tua vontade…”. Dizem-nos que quando a aflição
vem, Deus sempre deseja cura, que Ele não tem nada a ver com sofrimento,
e que tudo o que devemos fazer é invocar a resposta que desejamos pela
fé. Somos exortados a invocar o sim de Deus antes de Ele falar.
Afaste-se dessas distorções da fé bíblica! Elas são concebidas na mente
do Tentador, que nos seduz a trocar fé por magia. Nenhuma quantidade de
palavreado piedoso pode transformar tamanha falsidade em sã doutrina.
Devemos aceitar o fato de que Deus às vezes diz não. Às vezes, Ele nos
chama para sofrer e morrer mesmo se quisermos reivindicar o contrário.
Nunca um homem orou de modo mais fervorosamente do que Cristo orou no Getsêmani. Quem vai declarar Jesus falhou ao orar com fé? Ele colocou o Seu pedido diante do Pai com suor como sangue: “Passe de mim este cálice.” Essa oração foi simples e sem ambiguidade – Jesus estava gritando por socorro. Ele pediu para o cálice horrivelmente amargo ser removido. Cada grama de Sua humanidade encolheu-se diante do cálice. Ele implorou ao Pai para livrá-lo de Seu dever.
Mas Deus disse não. O caminho do sofrimento era o plano do Pai. Era a vontade do Pai. A cruz não era ideia de Satanás. A paixão de Cristo não foi o resultado de eventualidade humana. Não foi o plano acidental de Caifás, Herodes, ou Pilatos. O cálice foi preparado, entregue, e administrado pelo Deus Todo-Poderoso.
Jesus qualificou Sua oração: “Se for a tua vontade….” Jesus não “tomou posse e reivindicou”. Ele conhecia o Pai bem o suficiente para entender que era provável não ser a Sua vontade remover o cálice. Então, a história não termina com as palavras, “E o Pai se arrependeu do mal que Ele havia planejado, removeu o cálice, e Jesus viveu feliz para sempre”. Tais palavras beiram à blasfêmia. O evangelho não é um conto de fadas. O Pai não negociaria o cálice. Jesus foi chamado para bebê-lo todo. E Ele o aceitou. “Contudo, não se faça a minha vontade, e sim a tua” (Lucas 22.42).
O evangelho não é um conto de fadas. O Pai não negociaria o cálice. Jesus foi chamado para bebê-lo todo.
Esse “contudo” foi a oração suprema da fé. A oração da fé não
é uma exigência que apresentamos para Deus. Não é a suposição de um
pedido garantido. A oração autêntica da fé é aquela que é moldada na
oração de Jesus. É sempre expressada em espírito de subordinação. Em
todas as nossas orações, devemos deixar Deus ser Deus. Ninguém diz ao
Pai o que fazer, nem mesmo o Filho. Orações são sempre solicitações
feitas em humildade e submissão à vontade do Pai.
A oração da fé é uma oração de confiança. A própria essência da fé é confiança. Confiamos que Deus sabe o que é melhor. O espírito de confiança inclui uma disposição de fazer o que o Pai quer que façamos. Cristo encarnou esse tipo de confiança no Getsêmani. Embora o texto não seja explícito, é claro que Jesus saiu do jardim com a resposta do Pai à Sua declaração. Não houve maldição ou amargura. Sua comida e Sua bebida foram a vontade do Pai. Uma vez que o Pai disse não, estava feito. Jesus se preparou para a cruz.
R. C. Sproul
In: iPródigo
Márcio Melânia
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